Metrópolis como instrumento da classe dominante

Este é o primeiro de dois textos que analisarão o filme Metrópolis sob a ótica do livro “Sociedade do Espetáculo” de Guy Debord.

Não contextualizarei historicamente o livro de Guy Debord por motivos de espaço e por este texto virtual fazer parte de um formato de comunicação que tem como característica a informação rápida e os textos dinâmicos, pagando o óbvio preço de uma superficialidade facilmente detectada, porém, aconselho aos interessados que pesquisem mais sobre o livro e o momento histórico em que foi produzido, pois assim se completaria o entendimento proposto pelo presente texto, assim como pelo próximo a ser escrito.

Em um primeiro momento o filme Metrópolis pode parecer uma crítica justa e alarmante, quem sabe até uma denúncia, afinal de contas suas cenas mostram trabalhadores explorados em fábricas e sob condições precárias. Mostra também os ricos proprietários de fábricas vivendo em luxuosos palacetes, divertindo-se em jardins e propriedades que se assemelham aos deprimentes condomínios fechados de nossos dias.

Porém, o que percebemos com isso e ainda mais com seu desenrolar é uma busca pela aceitação das classes dominantes e da ordem vigente.

Para levarmos da teoria para a prática cito os seguintes trechos do filme: o filho do grande proprietário indo até os trabalhadores para ajudá-los, mas fazendo isso apenas porque está apaixonado por uma bela moça proletária e o próprio significado da greve dos trabalhadores, sendo a greve dentro do filme entendida como algo demoníaco e que foi organizada por um robô. O final parece mais reacionário ainda, com o trabalhador apertando as mãos do grande industrial, em uma fictícia e socialmente paralisante união entre as classes.

Apenas como indicação, e explorando o tema “cinema e a luta entre classes sociais”, cito o filme “Outubro” de Serguei Eisenstein, produzido assim como Metropolis em 1927 e que marcava os 10 anos da Revolução Russa, que originou a formação da União Soviética, este sim um legítimo representante da luta contra o sistema opressor que o filme de Lang aparentemente ataca.

Sendo assim, não acredito que o filme tema deste blog seja uma crítica social. Na verdade, podemos entendê-lo como o oposto disso, como mais um instrumento, assim como o é todo o cinema produzido para as grandes massas, alastrados de finais felizes e confortadores, que visa manter a (des) ordem vigente.

Logo, não se deve enganar pela aparência de denuncia do filme, e devemos perceber o teor consciente do mesmo, já que, com ações tão pensadas como as colocadas no início do texto, podemos perceber uma intenção altamente reacionária e que, assim como boa parte do cinema alemão do mesmo período, acaba por asfaltar a estrada para o desenvolvimento da extrema direita naquele país.

Para fazermos uma análise positiva do filme teríamos que nos ater a parte técnica do mesmo, porém cairíamos em um grave erro ao separar a parte técnica do discurso, pois estaríamos propondo o afastamento do filme, enquanto formato, em relação ao seu próprio significado social que é ditado pelo seu conteúdo temático, ao menos no tipo de análise que nos interessa aqui.

“…Mas o espetáculo não é necessariamente um produto do desenvolvimento técnico do ponto de vista do desenvolvimento natural. Ao contrário, a sociedade do espetáculo é a forma que escolhe o seu próprio conteúdo técnico. Se o espetáculo, tomado sob o aspecto restrito dos “meios de comunicação de massa” , que são sua manifestação superficial mais esmagadora, que dá a impressão de invadir a sociedade como simples instrumentação, tal instrumentação nada tem de neutra: ela convém ao automovimento total da sociedade. Se as necessidades sociais da época na qual se desenvolvem essas técnicas não podem encontrar satisfação com sua mediação, se a administração dessa sociedade e qualquer contato entre os homens só pode ser exercido por intermédio desta força de comunicação instantânea, é porque essa “comunicação” é essencialmente unilateral; sua concentração se equivale a acumular nas mãos da administração do sistema os meios que Ihe permitem prosseguir nessa precisa administração.” 1
1 DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. Rio de Janeiro: Ed. Contraponto, 2008. páginas 20 e 21.

Uma resposta to “Metrópolis como instrumento da classe dominante”

  1. Mariana Says:

    A visão de Metrópolis como instrumento da classe dominante é bastante rica é fundamentada. Ela possibilita uma outra forma de reflexão sobre mídia e poder, a partir do momento que mostra como essa forma de mídia (a indústria cinematográfica) age sutilmente sobre a sociedade em momentos oportunos. Muito interessante!

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